Uma pesquisa recente trouxe esperanças para quem vive com a doença de Huntington ao demonstrar que uma terapia genética consegue abrandar o progresso da condição em cerca de setenta e cinco por cento nos casos em que é administrada em dose elevada. A doença de Huntington é um distúrbio hereditário do cérebro que provoca movimentos involuntários, alterações de humor e declínio de funções cognitivas, sendo até agora uma patologia sem cura. O tratamento normalmente dedicado ao alívio dos sintomas não consegue alterar o curso da doença, o que torna este avanço particularmente significativo.
O ensaio clínico executado foi de fases um e dois, envolvendo vinte e nove pessoas com Huntington que foram comparadas com um grupo de controlo composto por participantes de um estudo observacional de longo prazo chamado Enroll-HD, que acompanha a evolução natural da doença em pessoas que não recebem a terapia experimental. Do grupo que recebeu o tratamento por via de terapia genética denominado AMT-130, doze receberam uma dose alta e foram seguidos durante três anos. Estes doze amostraram um abrandamento da progressão da doença cerca de setenta e cinco por cento inferior ao observado no grupo de controlo. Os investigadores verificaram ainda que estes participantes tiveram pontuações significativamente melhores nas avaliações do progresso da doença do que aquelas observadas em quem não recebeu o tratamento.
Outra descoberta importante foi a diminuição em níveis de proteína encontrada no líquido cefalorraquidiano nos participantes tratados. Essa proteína é um marcador de dano nervoso, e nos doentes tratados verificou-se que os valores ficaram inferiores aos medidos antes do início da terapia, o que sugere que o dano neural foi realmente reduzido.
A terapia AMT-130 é administrada uma única vez através de injeção cirúrgica num local especificado do cérebro. O estudo constatou que foi bem tolerada pelos participantes, sem sinais de efeitos adversos graves associados ao procedimento nestes três anos de observação. A segurança a longo prazo continua a ser avaliada, mas os resultados iniciais sugerem que se trata de uma opção viável para modificar o curso da doença geneticamente desencadeada.
Ainda que os resultados sejam muito encorajadores, é importante referir que o ensaio clínico ainda não foi publicado numa revista científica com revisão por pares, o que significa que os dados não passaram por todos os processos habituais de validação externa. Além disso os efeitos a três anos são promissores mas não garantem que o abrandamento da evolução da doença se mantenha para prazos mais longos ou em todos os pacientes. Outro ponto de atenção é o número de participantes tratados em dose elevada ser relativamente pequeno, o que limita a generalização imediata dos resultados.
A equipa responsável destaca ainda o desafio da administração da terapia, que exige cirurgia especializada para colocar a injeção diretamente no cérebro. Actualmente esse procedimento demora entre doze e dezoito horas, o que torna difícil que se torne acessível em larga escala até que se desenvolvam métodos mais rápidos e menos invasivos.
Os investigadores envolvidos consideram este tratamento como um “proof-of-concept” muito importante porque é a primeira vez que uma intervenção em Huntington demonstra um efeito de modificação da doença duradouro em humanos, para além de alívio sintomático. Se se confirmar em estudos maiores e mais prolongados, poderá mudar radicalmente o prognóstico da doença, permitindo intervenções mais precoces, possivelmente até antes do aparecimento dos sintomas, o que poderia atrasar ou reduzir a incidência de incapacidade.
Em termos de disponibilização futura, os responsáveis pelo desenvolvimento da AMT-130 planeiam apresentar candidaturas junto das autoridades reguladoras nos Estados Unidos, no Reino Unido e na Europa para que o tratamento possa vir a ser prescrito. No entanto ainda não se sabe se as agências vão exigir mais ensaios ou dados adicionais para autorizar o uso clínico generalizado.
Este avanço representa uma mudança de paradigma no tratamento da doença de Huntington, trazendo um forte motivo de esperança para doentes, cuidadores e cientistas. A possibilidade de desacelerar significativamente a progressão de uma doença neurodegenerativa tão devastadora abre novas fronteiras na medicina genética e terapêutica. Restam desafios, particularmente tornar o tratamento mais acessível e confirmar a durabilidade dos efeitos, mas este progresso oferece uma nova luz para o futuro dos que vivem com Huntington.